Receber crianças ou adolescentes que sofreram algum tipo de violação e precisam ser temporariamente afastados de suas famílias de origem. Este é o objetivo da modalidade de acolhimento chamada ?Famílias Acolhedoras?. O programa, que está sendo implementado agora em Minas Gerais, têm apresentado bons resultados na cidade paulista de Campinas e na catarinense São Bento do Sul.A presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente de Minas Gerais (Cedca), Regina Mendes, destaca que o trabalho com as famílias acolhedoras é fundamental para que a iniciativa seja bem sucedida. “Tem que ficar claro que a família vai ficar com a criança por um tempo, mas não é adoção. É preciso despojamento e muita clareza”, reflete.Durante o acolhimento, os esforços são voltados para a reestruturação dos vínculos entre a criança ou o adolescente e sua família de origem. Essa família não se restringe ao núcleo pais-filhos, mas também abrange a família extensa, como avós, tios e outras pessoas que sejam identificadas como referência afetiva para a menina ou o menino.Em Minas Gerais, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) está começando a implantar o programa no estado. Em 2007 foram analisadas propostas e este ano estão sendo realizadas capacitações em nove cidades: Belo Horizonte, Campo Belo, Contagem, Delta, Governador Valadares, Lagoa da Prata, Montes Claros, Poços de Caldas e Viçosa. A gerência dos programas e dos recursos destinados pelo estado ficará a cargo das prefeituras. O objetivo é capacitar psicólogos, assistentes sociais e gestores a selecionar as famílias para o acolhimento. “É na seleção que é detectado se a família quer realmente acolher, ou se na verdade pretende adotar [o que é proibido]. É feita uma entrevista social, uma formação da família e uma visita domiciliar, porque todos na casa têm que querer acolher. Há todo um trabalho”, esclarece a coordenadora especial de políticas pró-criança e adolescente da Sedese, Fernanda Flaviana Martins.Em Belo Horizonte, apenas a Casa de Acolhida Novella, criada em 2001, oferece esse tipo de atendimento. Neste período, cerca de 10 crianças foram inseridas em famílias acolhedoras. A psicóloga da entidade, Amanda Carvalho, ressalta os benefícios da experiência. “A criança vive outra realidade familiar, não vive o institucional, que é o abrigo. Quanto mais ela vive esse pertencer à família, mais ela vai saber trazer isso para a família dela”, esclarece. Enquanto estão acolhidos, as crianças ou os adolescentes se encontram semanalmente com a família de origem para fortalecimento dos vínculos.VantagensNo Brasil, as primeiras iniciativas de acolhimento por famílias são de meados da década de 1990. O Serviço Alternativo de Proteção Especial à Criança e ao Adolescente (SAPECA), de Campinas, no interior de São Paulo, foi implantado em 1997 e é considerado uma das referências nacionais.A coordenadora do programa, Adriana Pinheiro, ressalta que, em comparação com outras modalidades de acolhimento, a Família Acolhedora apresenta diversas vantagens. “A criança recebe um atendimento individualizado e se desenvolve muito mais, porque também é muito mais estimulada. Na família acolhedora ela se identifica, tem espaço para falar e ser ouvida. Por melhor que um abrigo seja, ele não consegue oferecer esse atendimento tão individualizado”, explica.Outra vantagem dessa modalidade é que ela é menos onerosa do que o acolhimento institucional, como os abrigos. Não há parâmetros nacionais para o subsídio que deve ser destinado à família acolhedora. No caso de Campinas, cada família recebe um auxílio mensal de R$ 415 por criança. Em Minas, no caso da Casa de Abrigo Novella, não é oferecido esse tipo de benefício.Em São Bento do Sul, em Santa Catarina, a família acolhedora é a única forma de acolhimento de crianças e adolescentes afastados de suas famílias. Não há casas lares, abrigos, casas de passagem ou instituição semelhante. De 2003 até junho de 2008, o programa de famílias acolhedoras de São Bento do Sul atendeu 59 crianças. Destas, 36 retornaram para suas famílias de origem e 23 foram encaminhadas para adoção.”Em São Bento do Sul é viável ter só o programa de família acolhedora. Não se cogita a implantação de outra modalidade, como o abrigo”, relata a assistente social da Comarca de São Bento do Sul e integrante do Grupo de Trabalho Nacional Pró-Convivência Familiar e Comunitária, Isabel Bittencourt.Para a assessora técnica da Associação Brasileira Terra dos Homens, Marcy Gomes, mesmo com as vantagens do programa família acolhedora, ele não deve ser a única opção. Outra ressalva feita pela especialista, que acompanhou o programa no Rio de Janeiro por dez anos, é que o trabalho realizado com as famílias acolhedoras deve ser próximo e sistemático. “O processo seletivo deve incluir visitas domiciliares, entrevistas com todos os membros da família e levantamento das redes com as quais essas famílias contam dentro das comunidades”, explica.Quantos aos vínculos estabelecidos durante o período de acolhimento, Isabel fala com a segurança de quem acompanha a iniciativa de São Bento do Sul há mais de cinco anos: “O apego é inerente ao programa e deve existir. A referência de afeto é positiva, não inviabiliza o programa, pelo contrário, essa vinculação é necessária”, explica. Não são raros os casos em que famílias acolhedoras e de origem se conheceram e passaram manter contato freqüente.